terça-feira, setembro 25, 2007

RETALHOS DAS MINHAS MEMÓRIAS - SUDÂO (5)

Como mencionei atrás, o meu acampamento de James Diko, estava na "ponta" mais ao Sul do Sudão, quase na fronteira com a Zaire, fronteira essa, que eu nunca soube onde era precisamente. Naquele tempo nâo existiam GPS, para que eu pudesse demarcar com precisão, a fronteira.
Muitas vezes andávamos atrás dos elefantes e John, o meu pisteiro, me dizia. "Aqui é o Zaire".
Eu nem me tinha dado conta de que estávamos nesse país.
Mas para que a coisa fosse "legal", conto-lhes uma brevíssima historia, de como consegui a autorização, para caçar no que é hoje Congo.
Um dia chegou ao acampamento, pela tarde, um homem e uma mulher com um bebé que trazia um bracinho todo queimado. O bebé tinha metido o braço numa panela de água a ferver, e estava muito mal. O homem perguntou-me se eu podia fazer alguma coisa por ele. Mas o que mais gostei foi que o homem falava um francês mais ou menos intendível. Contou-me como tinha sido o acidente, e tambem me contou, que ele era o CHEFE AZANDE, (Zémio) o maior daquela região tâo remota. A sua Jurisdição ia até ao Rio Uele, que passava a uns 30 quilómetros ao Sul, rio esse que mais tarde se transforma no fabuloso Ubangui-Chari, que passa pela República Centro Africana. Perguntei-lhe como "andava ele de elefantes", enquanto ia limpando as feridas que tinha o bebé, com Savlon que é uma substancia para limpar e se usava também e cirurgia.
Disse-me que havia muitos na sua zona e que se eu quisesse podia ir lá matar os que quisesse. Mais uma vez eu lhe perguntei, se não havia problema e ele comentou-me que ELE É QUE MANDAVA, porque o presidente não mandou nunca nenhuma ajuda para eles etc etc.
Terminei de vendar o bracinho do miúdo com aquelas vendas amarelas que têm uma substancia para as queimaduras, que era parte do botequim que era obrigatório trazer nos carros de safari.
Falando com o Chefe, disse-lhe que era melhor que ficasse numa das casas, dos trabalhadores com a sua mulher para que eu pudesse dar continuidade ao tratamento do miúdo, até que estivesse fora de perigo.
O homem agradeceu-me muito, John levou-o a instalar-se e eu à noite, mandei-lhe meia garrafa de rum que trazia dentro da caixa das bebidas.
Total a partir daquele momento foi um grande amigo, e ser amigo do Chefe dos Azandes, não é coisa pequena, porque segundo John , o homem era o ser supremo naquelas terras. John um dia disse-me que se havia alguma coisa grave na sua jurisdição, ele podia até mandar matar a alguém.
Depois disso, encontrar elefantes "era canja" como diziam na "nossa" terra, "lá nos Beira".
Também notei que a mulher do chefe, tinha uma tremenda papada devido à falta de iodo, pois criou bócio, doença que havia muito naquela região, por falta de sal de mar iodatado. Disse-lhe que quando viesse o avião de Juba trataria que me mandassem pastilhas de iodo para que a sua mulher as tomasse e a doença parasse aí ou talvez até curar-se. Durante os meus anos de andar em África, notei que uma pastilha que a nós somente era um paliativo, a um negro que nunca tinha tomado nada de medicamentos, fazia milagres.
Durante o safari de Pitt eu já tinha a "autorização" e um dia à noite chegaram uns homens do Chefe a dizer-me que fosse a um lugar que lá andavam muitos elefantes.
Preparámos tudo, e aí nos vamos Pitt e eu em direcção ao Zaire, por uma picada que eu tinha mandado abrir para chegar até o que eles diziam que era a fronteira.
Começámos a caminhar, mal nasceu o Sol e não tardou meia hora que ouvíssemos os elefantes barritar.
Havia uma pequena colina e vimos os elefantes abaixo a entrar numa floresta fechada que rodeava um rio.Como o veto estava às mil maravilhas, sempre soprando-nos na cara, seguimos a manada e começámos lentamente a entrar na floresta para ver se víamos o tal elefante de pontas compridas que Pitt queria para fazer a sua cama. Íamos muito devagar, vendo sempre como soprava o vento,, quando John parou e mostrou-me ao meu lado esquerdo, encostado a uma grande árvore um elefante com pontas compridas, ainda que nâo fossem tâo pesadas. Perguntei a Pitt se lhe gostavam e como a resposta foi afirmativa, preparámo-nos para atirar, porque po elefantes estava a menos de 20 metros de nós a a olhar para nós, sem saber que fazer, pois nâo podia olfatear-nos. Eu baixinho disse a Pitt, atira que eu ajudo-te. Vio-o apontar a 458 e eu apontei com a 577, ele disparou, e logo eu. Vi como o elefante recebeu o impacto daquelas duas balas poderosas e vi como levantou as duas patas dianteiras, e caiu para o lado. As pontas eram bonitas compridas , mas nâo pesavam muito; era o que Pitt queria.
Sacámos as pontas e seguimos para o Sudão sem primeiro mandar cortar a melhor carne para que fosse enviada ao meu amigo O Chefe Azande.
Cacei vários elefantes nesse lugar ao redor do Rio Uele.
É um lugar que nunca esquecerei, porque aí havia uma paz, somente quebrada por mim, com algum tiro, quando caçávamos elefantes ou bongos.
Victor "Hunter"

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