sábado, outubro 01, 2005

DEDICADA ÀS PESSOAS DE ANGOLA - 7



DEDICADA ÀS PESSOAS DE ANGOLA E AOS QUE GOSTAM DE ÁFRICA
Carta 7 –

Começamos a viajar rumo ao Sul durante quase uma hora. Íamos vendo alguns animais pequenos do deserto, e somente uma vez conseguimos ver um Gemsbuck ou Orix bastante longe. Aquela quantidade de animais que existia nesse lugar, antigamente, tinha-se acabado, quase se extinguiram. Agora tentavam recuperar-se pouco a pouco, e com sorte em alguns anos haveria uma quantidade bastante para que esteja ameaçada a sua existência.
A picada que seguíamos, e que pouco se via, de repente mudou na direcção do Oeste. Ia levar-nos quase numa linha recta à foz do Rio Cunene. Andámos um par de horas mais e as dunas que víamos ao longe fizeram-nos lembrar que estávamos quase a chegar ao mar, que era a nossa meta para esse dia.
Queríamos chegar com luz do dia, para poder encontrar um lugar onde, pernoitar e que pudera ser seguro. Que a areia do deserto nesse sítio estava sumamente branda e tínhamos que usar a tracção às quatro rodas para poder conseguir velocidade para subir as dunas, num lugar que tínhamos escolhido, por ver que eram mais baixas nesse lugar.
Com muita dificuldade, ajudando-nos sempre com a tracção dupla lá conseguimos subir as primeiras dunas, aproveitando sempre o desnível entre uma e outra para poder continuar o nosso caminho, sem enterra-nos. Foi difícil, mas depois de muito batalhar com a areia lá conseguimos chegar à parte mais alta, que dava para o rio Cunene. Já eram quase as cinco da tarde quando avistamos umas construções que nos pareceram abandonadas. Com o cuidado que sempre tínhamos, começamos a baixar um pouco até aos velhos edifícios, e então lembrei-me que alguma vez tinha estado naquele lugar, quando era lugar de abastecimento de pescadores e alguns mineiros daquela região. Hoje parecia que somente fantasmas rondavam por aquelas bandas.
Como se pode destruir toda uma infra-estrutura em 30 anos? Deu-me uma grande pena a lembra-me daqueles pioneiros que fizeram tanto esforço para construir as suas casas e os seus armazéns, com materiais que tinham que trazer de Moçâmedes em camponês, fazendo um esforço titânico, para que hoje isto se tenha transformado numa “cidade fantasma”. Nunca mais, creio eu..., vai haver gente tão tenaz como aquela que aí se assentou no tempo da colónia. Nuns anos mais este lugar ficará somente na memória de gente como eu e dos descendentes das pessoas que a construíram, se é que ainda são vivos.
As casas tinham todos os vidros partidos, a maioria não tinha portas, somente as paredes e os tetos ainda existiam; tinham sido construídas por mãos que sabiam o que estavam a fazer. Tinham sido construídas para durar.
Estávamos na foz do Rio Cunene, o lugar mais ao Sul de Angola, o lugar onde termina esse país para começar a Namibia com a sua Costa dos Esqueletos.
Tínhamos alcançado a meta que nos tínhamos proposto: chegar a esse ponto.
Num dos terraços de uma das casas, paramos os carros e aí estendemos os nossos colchões e sacos de dormir para passar aí a noite e descansar do dia pesado que tivemos para chegar aqui.
Comemos das nossa provisões de latas, e dormimos ao ar livre, embalados pelo ruído do vento, e do murmúrio que as águas do Cunene faziam ao encontra-se com a agua do Oceano Atlântico.
Levantei-me cerca das 5 da manha, já a claridade começava a despontar sobre as dunas que rodeavam aquele fantasmagórico lugar; preparei o fogo e aticei alguns carvões que tinham ficado da fogueira da noite, para fazer um café que nos faria acordar daquela modorra que tínhamos esta manha.
Depois de saborear um bom café, forte e negro como gostamos, com a toalha na mão dirigi-me ao rio para dar-me um banho. Pois a forte corrente daquele lugar, não deixava que a agua doce se misturasse com a água salgada. Um suculento pequeno almoço, para ganhar forças para estar preparados para o resto da viagem que sabíamos ia ser difícil, para sair dessa parte mais desértica do Sul de Angola.
Passar para o outro lado da Namibia podia ser uma forma para ver e poder apreciar a Costa dos Esqueletos.
Se algum dia pode visitar este lúgubre, mas interessantíssimo lugar, verão que a Costa dos Esqueletos, que tem uma grande extensão de praias e desertos começa no Rio Huab, até ao Cunene, onde nos encontramos agora.
Devido as fortes correntes antárcticas, essas praias têm mais barcos encalhados que qualquer outro lugar do mundo. As correntes atiram aos descuidados capitães contra rochas e contra os bancos de areia desse lugar.
Há um fenómeno, que é ver barcos mais de duas milhas enterrados no deserto, ainda que muitos estejam nas praias, porque o mar se vai retirando deixando a descoberto as estruturas dos navios, que parecem uns fantasmas no meio do nada.
Há dezenas de barcos de todas as nacionalidades, de todos os tamanhos, que se encontram nestas praias. Vão-se oxidando e a areia arrastada pelo vento vai enchendo-os e carcomendo o ferro de que estão feitos, transformando-os pouco a pouco, em um emaranhado de ferros, em que muitas vezes já não se pode distinguir as formas originais.
Mas isso será para uma nova aventura, somente há que dizer que os nossos navegadores portugueses, como Diogo Cão, Vasco da Gama e outros, deixaram neste lugar alguns cruzeiros como prova de que os portugueses tinham estado nesse lugar. Note-se na foto o desenho gravado na pedra de uma das caravelas que os nossos heróicos antepassados usaram para chegar a esse lugar.
Depois de empacotar bem todo o nosso equipamento, começamos a subir outra vez as dunas e dirigimo-nos para o mar, pois tínhamos a intenção de seguir por um bom tempo pela praia, afim de chegar até à Baia dos Tigres.
(Continua na carta 8)

1 comentário:

Vagabundo disse...

Não tenho previlégio de conhecer África, mas sempre tive uma atracção especial pelo seu Povo, principalmente.
Gostei muito de ler estas magnificas cartas.

Vagabundo