sábado, outubro 01, 2005

DEDICADA ÀS PESSOAS DE ANGOLA - 11


DEDICADA ÀS PESSOAS DE ANGOLA E AOS QUE GOSTAM DE ÁFRICA
Carta no. 11-
Já eram as 8 da manha, quando deixamos para sempre Sá da Bandeira. Atrás deixávamos um pouco do nosso coração. Outra vez as despedidas...raios porque será que uma pessoa não pode ter tudo o que anela? Queria poder estar em muitos sítios ao mesmo tempo, para não ter que despedir-me de lugares, de coisas e de gente que foram e são importantes na minha vida.
Cada dia que passa da vida de uma pessoa, um vai perdendo alguma coisa: um amigo que se vai, um velho amor que sabemos que perdemos para sempre, por alguma notícia recebida, um lugar que se abandona e que não sabemos se voltaremos a vê-lo outra vez. Não sei se passa o mesmo com as outras pessoas, mas eu sinto um aperto no peito, que algumas vezes até se me dificulta respirar.

Não quis olhar para trás, porque ali ficavam muitas recordações, que foram realmente importantes para mim. Pedi a Deus, que dera um descanso eterno aos amigos que lá tinham falecido.
Tomei ar, caminhei uns pouco para relaxar-me e, meti-me no carro para seguir viagem. Adeus Sá da Bandeira, até sempre, que os homens de boa vontade continuem a fazer de ti a cidade agradável que sempre foste.
A estrada tinha alguns buracos, mas podia-se manter uma velocidade razoável. Os jeeps estavam com os tanques cheios, os bidões com água até ao cimo; tínhamo-nos abastecido de fruta e verduras para poder aguentar dois ou três dias mais.
Continuámos a viagem, emergidos nos nossos pensamentos e recordando o que tínhamos passado até agora.

Estávamos a atravessar uma das áreas que mais lutas teve durante a guerra civil de Angola. Por ela entraram muitos tanques e tanquetas sul-africanas, que naquele tempo ajudavam a Jonas Savimbi o líder da UNITA. Eles lutavam para que as tropas de Angola, russas e cubanas, não pudessem estender o seu controlo e a hegemonia comunista até ao Sul.
Muitas vidas terminaram naquelas terras que agora atravessávamos. Muitas minas estão enterradas nos caminhos perpendiculares e paralelos à estrada que agora percorríamos. Quanta morte, tinha esta guerra espalhada, meu Deus, e quantos mais inocentes iam a ficar sem pernas e braços. Especialmente as crianças que não deixavam de brincar em lugares perigosos, e às vezes uma mina voava-lhes as pernas, ou os matava. Que culpa têm eles de uma guerra da qual nada sabem e que continuará a matar pessoas por gerações?
Continuámos a nossa viagem sempre em direcção ao Sul, pelo caminho iam aparecendo vestígios dessa luta fratricida.
Víamos tanques que tinham sido abandonados pelos contendentes dessa guerra, víamos canhões que estavam bons para o ferro velho. Não sei porque os deixavam aí ao lado da estrada. Será para que se lembrem que isto nunca devia ter acontecido?
Havia tanques russos, que usavam os cubanos nesta aventura africana de Fidel Castro.
Tinham sido enviados a lutar a Angola desde La Havana, para ajudar o que eles diziam que eram os “hermanos angoleños”. O que fizeram foi saquear muitas das coisas que os portugueses tinham deixado naquele país.
Dizem que até alguma das modernas fábricas de enlatar peixe levaram para Cuba nos seus barcos. E muitas coisas que se dizem, que eu não posso verificar se são ou não verdade, mas usando o velho ditado “ não há fumo sem fogo”, quizás isso seja a realidade.
Carros blindados de transporte sul-africanos, que algum dos comandos tinha perdido, na sua avançada até Luanda; porque eles sim chegaram até às aforas dessa cidade, mas por falta de apoio tiveram que retirar-se.
Tanto dinheiro, tantos milhões de dólares atirados ao lixo, porque estes políticos, não se puderam entender. Todos queriam os diamantes e o petróleo de Angola. Todos queriam o ouro e os biliões de toneladas de minerais que existem naquelas terras. Por isso enviavam tropas de Cuba de Rússia da Africa do Sul e, até do Congo vieram ajudar para ver quem levava a maior fatia do pastel. Semearam terror, pobreza e morte, foi o que trouxeram para este lugar que antes era um paraíso. Deixaram-nos o quê? Mais um canhão abandonado à beira da estrada? Mais uns milhares cegos e aleijados? Mais fome? Cada vez que vejo na televisão aos velhos e decrépito Fidel Castro, lembro-me das atrocidades que fez em Angola. Maldito comunista. Malditos os que provocam guerras. Malditos líderes autoritários. Malditos os que fazem guerra em nome de Deus...Uff, já me cansei.
Mais valia que com esse dinheiro, tivessem erigido escolas, hospitais, fontes de trabalho, mas isso... é uma utopia, pensar que os políticos africanos pensassem assim.
Depois da tristeza de abandonar Sá da Bandeira, agora vinha-me a raiva de ver estes destroços. Tinha que sair daí o mais rápido possível pois isso não era nada bom para a minha saúde mental.
Era imprescindível que saíssemos o mais rapidamente desse lugar e nos dirigíssemos às quedas da M’Pupa para sacar da mente aquela visão de destruição que estava ao longo da estrada em que viajávamos.
Tentei dormir um pouco, e fechei os olhos. Queria abri-los num lugar onde houvesse paz e longe dos problemas que acabava de ver.
Depois de três horas de viagem, chegámos à beira do Rio Cunene, acima das quedas de água da M’Pupa.

Aí a tranquilidade era total. Os pássaros cantavam e ouvia-se o mugir do gado, arreado pelos seus donos os Himbas/Mukubais daquela região.
Começámos a armar o acampamento, porque queríamos passar aí os últimos dois dias da nossa aventura Angolana. Estávamos nisso, quando começaram a aparecer alguns habitantes daquele lugar. Estendiam-nos a mão para cumprimentar-nos. Era gente pacífica e de uma beleza singular.

Eram gente quase pura. Especialmente as mulheres. Os homens, alguns dos jovens vestiam alguma T-shirt que não condizia com a espécie de saia com voo que usam os Mukubais. Era uma “modernização” da indumentária, que a meu ver era uma desgraça para a sua tribo.
Estiveram observando-nos a terminar de armar o acampamento e entre eles deviam estar a criticar das coisas que nós os brancos necessitamos para viver e para viajar. Depararam-se fotografar e assim pudemos guardar nos nossos “memory sticks” aquelas belezas que sempre admirei das mulheres Himbas e Mukubais.
Algumas delas despediram-se e continuaram o seu caminho, talvez para ir ordenhar as suas vacas que deviam andar a pastar mais longe daí.
Aproveitei, para dar-me um banho no rio e sacar de em cima a poeira do caminho e também para sentir-me melhor depois da viagem que tínhamos feito.
Amanhã iria fotografar as quedas de água e seria assim a culminação da nossa viagem.
A tranquilidade do lugar, era boa para o espírito. Com ela descansaríamos de ver tanta desgraça. Queríamos borrar para sempre essas visões e lembrar-nos somente das coisas belas da viagem.
Estava a cair a tarde e fui caminhando devagar até ao Rio; aí sentei-me numa pedra e rezei. Sim rezei como há muito não o fazia. Rezei em agradecimento a Deus por deixar-me viver esta aventura, rezei porque necessitava falar com o Ser Supremo, que me ouvisse, que me atendesse. Não pedia muito, pensava eu: queria que naquela terra voltasse a haver paz, que se controlasse as doenças, especialmente o SIDA, que cada dia se estendia mais pelas povoações. Pedi ao Senhor, que velasse pela gente desse país, que não passassem fome, que pudessem criar os seus filhos como homens de bem, pedi pelos animais, pelos rios e pelos lagos e uma coisa em especial, pedi com todo o fervor que pode uma pessoa como eu, que livrasse África dos políticos corruptos que a governam agora; e especialmente agradeci-lhe por deixar-me fazer esta viagem à África que tanto amo.
A gracias Senhor.
Senti-me mais aliviado do peso que trazia sobre mim, senti que Deus me escutaria e que faria muita coisa boa por essa terra.
Jantámos junto à fogueira e não falávamos. Estávamos a olhar para as chamas que iam subindo pelo ar, retorcendo-se numa dança fantasmagórica. Era belo estar aí ao lado do fogo, rodeado pela Natureza e olhando ao Céu onde milhões de estrelas se podiam ver.
Uma canção brasileira diz: “O céu do Brasil tem mais estrelas” – é que eles nunca estiveram deitados olhando para o céu africano. Nunca tiveram ninguém, como o Fombe, que lhes contasse histórias como me contou ele a mim, quando era pequeno, sobre as estrelas de África. Eu sim tive a sorte de ter, esse grande amigo, segundo pai, conselheiro, pisteiro inigualável, feiticeiro, e meu cuidador desde pequeno, conhecedor de África como ninguém, que me contou essas histórias. Me contou contos sobre muitas das estrelas que eu via no céu, e por isso, ainda hoje me sorrio
lembrando-me delas e vendo os milhões que lá em cima, fazem parte do céu africano.
Fomos dormir, cansados daquele dia tão atormentado pelas recordações e pelas inconformidades. Mas a vida tem que continuar e eu não sou ninguém para mudar o mundo. Só quero paz e saúde para todos, não quero nada mais. O resto vem por si só...
Cerca das 5 da manha levantei-me, pus a agua para o café a ferver, e dirigi-me ao rio para dar-me um banho. A água estava fresca, agradável e sentei-me na areia do rio e gozei daquele momento, que não era de dia nem de noite. Havia uma ténue claridade que permitia ver as silhuetas das colinas e das palmeiras que aí havia. Depois daquele reconfortante banho, fui direitinho ao café, que me soube a gloria.
Enquanto ia tomando o meu café a sorvos, ia preparando os ovos para fazer uns ovos mexidos com fiambre para o “matabicho”.
Queria comer para ir-mos tirar umas fotografias às quedas de água do M’Pupa, e essas seriam as últimas desta viagem.
Caminhámos ao longo do Cunene para chegar às quedas.

Não eram quedas muito grandes, eram umas quedas agrestes, que impulsiva a água a uma grande força. Que imprimiam à corrente do rio uma velocidade que provocava os grandes rápidos kilómetros rio abaixo.
Uma companhia sul-africana, estava a uns kilómetros daí, aproveitando esses rápidos para trazer turistas, apaixonados pelo “raftting” e lançá-los com os seus “kayacks” corrente abaixo.
Tiramos algumas fotografias e aí estivemos a manhã fotografando e apreciando a beleza do lugar.
Tirámos fotografias a quedas pequenas, encontrámos mais Himbas nesse lugar. As mulheres vinham tentar vender-nos adornos feitos por elas, Comprámos algumas bugigangas feitas com contas e pedaços de metal, e mais uma vez elas se deixaram fotografar para a posteridade.
Continuámos, saltando de pedra em pedra para passar o dia buscando alguma coisa digna de interesse, para gravá-la com as nossas máquinas, porque certamente nunca mais viríamos a este lugar, pois a idade ia passando, mas isso sim levaríamos uma boa recordação deste lugar.
Usamos o nosso GPS, para anotar as coordenadas num mapa que mais tarde nos serviria de guia para poder escrever alguma coisa sobre o lugar; e também no meu “diário de bordo”, para não me esquecer nunca de nada do que tinha visto. Que bons aparelhos são estes, são de uma precisão incrível. Já o tinha dito atrás e repito, podem precisar um lugar com um erro de meio metro.
Graças a este pequeno aparelho que custa menos de 800 dólares, expedições a lugares de difícil orientação, como o deserto, agora tornaram-se fáceis de explorar, sem medo a perder-se.
Chegámos às quedas, e ficámos extasiados com a beleza e com a força que as águas tomavam nesse lugar. Isto era o final da nossa viagem. Aí uma vez mais nos metemos na água, numa piscina natural formada pelas rochas, para livra-nos do calor que fazia. Essas sim eram as quedas da M’Pupa.
Começámos a nossa retirada até ao acampamento, para empacotar todo o nosso equipamento e tomar a direcção da fronteira, que passámos essa tarde.
Adeus Angola, até sempre...
FIM
Victor “Hunter” Cabral

2 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns. Ainda nãi li tudo, mas já percebi que tem muito interessa.
E o Huambo? Fico ansiosamente á espera.
Um abraço
Erml.

Anónimo disse...

Sua prosa é expontãnea.. nota-se pelos "erros" e pela gramática adulterada em muitos dos parágrafos, principalmente naqueles que usa verbos transformados em substantivos. Tome bem nota do significado do verbo anelar... Mais: fiquei a saber que o obscurantismo polítivo também atinge pessoas semi-inteligentes.. e é pena. Pois o valor aqui demonstrado ficou manchado quando formula opiniões sobre os cubanos em Angola, criticando o lado mau da guerra, mas não referindo o quanto de bOM ELES FIZERAM EM ANGOLA, MINHA TERRA NATAL! HOJE INDEPENDENTE GRAÇAS A FIDEL QUE IMPEDIU QUE O CAPITALISMO CRIASSE UMA ANGOLA NEOCOLONIZADA...
Escreva suas coisas que sabe sem anelar(implícitamente) ser sapateiro acima da chinela.
eduarda_santos83@hotmail.com