segunda-feira, junho 11, 2007

Uma carta ao passado

Ontem fui passear pelo frio da manhã.
Há muito que não caminhava por esta cidade.
Passei pela rua em que vives, sem saber que te ia encontrar.
O destino quis que te visse,
Saías da casa alegre
Com dois netos pela mão
Pensei que o coração me ia sair pela boca,
Estava tão estupefacto e nervoso, que não sabia que fazer.
A única coisa que me me veio à mente, foi esconder-me atrás das árvores do passeio.
Ias em direcção ao jardim com o desvelo de avó.
Brincavas com os miúdos
Olhei para ti com a ternura que sempre te tive
Pensando que esses também podiam ter sido meus netos.
A tua cara, ainda que com algumas linhas de expressão mais profundas
Era a mesma cara pela que me apaixonei perdidamente
Naquela Beira tão distante, na África dos nossos amores.
Para mim continuas a ser a mais bela do mundo.
Os teus cabelos, ainda têm aqueles raios dourados
Ainda que agora mais curtos.
Lembras-te como adorava brincar com eles?
Passar as mãos pela tua cabeça
Sentir a tua sedosa cabeleira, era um prazer
Que não pôde dar-me nada do mundo.
Nem as flores mais belas do universo,
Nem a composição musical mais sublime
Me podiam ter dado um tão grande prazer,
Como o de tocar-te com as minhas mãos.
Era como compor a melhor sinfonia de amor,
Como criar o melhor perfume do mundo,
Como sentir o prazer de uma contemplação divina.
Enfim, foste o melhor que me sucedeu, em toda a minha vida.
Agora via-te tão atenta aos jogos dos meninos
Tão feliz, dando aquilo que sempre melhor soubeste dar:
Amor, mais amor e, uma ternura infinita,
Sem dares-te conta que eu te estava a observar.
Vendo-te como agora te via, neste parque em que estamos.
Tentei imaginar-te com aqueles vestidos dos anos sessenta,
Com a mini saia que muitas vezes levavas,
Naquelas terras de Moçambique que tão longe estão.
Como era excitante olhar para ti vestida somente
Com aqueles vestidos tão curtos, que mostravam
As mais belas pernas que eu tinha visto na minha vida.
Um corpo esguio como um bambu a que o vento movia,
Todo esse conjunto, colmado por uma cara de boneca
Que, trazia a todos os homens perdidos por ti.
E que sorte a minha...eu fui o escolhido.
Ter-te nos meus braços, nervosa, medrosa mas excitante,
Foi a experiência mais sublime da vida.
Foi como que um sonho do qual um não quer despertar
Por ter medo que essa experiência tivesse apenas sido um sonho.
Obrigado meu amor, por me teres escolhido para ser o teu primeiro amante.
Eu continuei escondido pelas tílias do parque,
Observando-te, amor da minha vida, de longe para que não me visses.
Pelo amor que te tenho, não quero de maneira nenhuma
Perturbar a paz em que vives agora.
Nào tenho o direito de alvoraçar a vida pacífica que tens.
Ah! Como gostaria de poder estar ao teu lado,
Poder contar-te que, apesar da minha vida de viajante incansável,
Sempre te tive no meu pensamento.
Muitas vezes dava-me conta que estava a falar contigo,
A descrever-te paisagens e lugares, como se os dois
Os estivéssemos a visitar juntos.
O homem que escolhes-te para estar ao teu lado,
Sei que foi um bom homem, que mereceu toda a ternura e compreensão Que lhe deste, até à sua morte.
Lembras-te que estivemos juntos, uma semana antes de casar-te com ele.
Que me dizias que me amarias para sempre?
Eu entendi, que a vida que tinha, não era uma vida que tu pudesses aguentar.
Uma vida de aventureiro, que não queria problemas,
Que unicamente lhe interessava aventuras loucas e constantes.
Ah! Meu amor, se tivesse sabido o que realmente era a vida...
Nunca te tinha deixado, porque querida.
Tu foste e és, o grande amor da minha vida.
Agora vejo-te regressar a casa. O frio da tarde está a começar a cair
E, aí vais tu com os teus netinhos.
Eu regressarei ao país onde vivo há muitos anos.
E tu continuarás com a tua vida, sem nunca saberes
Que eu te estive a observar durante algumas horas.
Ao ver a porta fechar-se, uma lágrima corre pela minha face
Porque sei que tu para mim, continuas a ser o único grande amor da Minha vida,... mas, impossível.
Na hora em que Deus me chame a dar-lhe contas da minha existência,
Nesta terra , eu terei na mão, aquela velha fotografia tua que me dedicaste no dia dos meus anos, que de tanto tocá-la já tem os bordos gastos, e que me acompanhou durante toda a minha vida.
Quero que tu, sejas a última visão que tenha deste mundo.
E com o diz aquela canção de amor:
“Espero-te no céu, coração...”


Victor Cabral "The Hunter"